O Ministério da Defesa informou nesta segunda-feira (13), que encaminhará uma representação à Procuradoria-Geral da República (PGR), contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
A medida foi anunciada por meio de nota e foi motivada pela declaração feita no último sábado (11), pelo ministro do Supremo segundo qual o Exército se associou a um “genocídio” durante a pandemia do novo coronavírus.
As declarações do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em relação à presença de militares no Ministério da Saúde provocaram uma crise que fica maior a cada dia.
O ministro da Defesa, Fernando Azevedo, os comandantes das Forças Armadas, e o vice-presidente Hamilton Mourão criticaram o magistrado. Durante uma transmissão on-line, o integrante da mais alta Corte do país afirmou que “o Exército se associa a um genocídio”.
Ele se referiu ao fato de militares participarem da gestão e da formulação de políticas públicas voltadas ao combate à covid-19 no governo federal. O ministro interino da pasta, Eduardo Pazuello, é general da ativa.
Com o objetivo de tentar amenizar a indisposição criada com as afirmações de Gilmar Mendes, o presidente do STF, Dias Toffoli, ligou para Azevedo e para o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. Desde o começo da tarde de ontem, Toffoli atua nos bastidores para tentar conter a escalada da crise e apagar o incêndio. Ele ressaltou que a visão de um ministro não representa o pensamento da Corte em si e que o Supremo atua com os demais poderes para amenizar os impactos da pandemia do novo coronavírus.
O presidente do tribunal entrou no assunto após a nota divulgada por Azevedo e os comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica.
O texto diz que “comentários dessa natureza, completamente afastados dos fatos, causam indignação”. “Trata-se de uma acusação grave, além de infundada, irresponsável e, sobretudo, leviana. O ataque gratuito a instituições de Estado não fortalece a democracia.” Ao fim, a mensagem ressalta que a PGR será acionada para apurar eventuais responsabilizações pelas declarações.
O documento é assinado, também, pelos comandantes do Exército, general Edson Pujol; da Marinha, almirante Ilques Barbosa; e da Força Aérea Brasileira, Carlos Bermudez, o que não é usual e foi considerado um ato perigoso na avaliação de quem está dentro dos quartéis.
No governo, a insatisfação é geral e, antes de publicar uma nota rebatendo as declarações de Gilmar Mendes, militares buscaram o aval do presidente Jair Bolsonaro, que concordou. A visão do Executivo, no momento, é que um posicionamento público dele sobre o assunto criaria um atrito intenso e desnecessário. Por isso, essa tarefa deve ficar com seus interlocutores.
Gilmar Mendes disse, no sábado (11), em live da revista IstoÉ, que “não podemos mais tolerar essa situação que se passa no Ministério da Saúde”. “Não é aceitável que se tenha esse vazio. Pode até se dizer: a estratégia é tirar o protagonismo do governo federal, é atribuir a responsabilidade a estados e municípios. Se for essa a intenção, é preciso se fazer alguma coisa. Isso é péssimo para a imagem das Forças Armadas”, destacou. “É preciso dizer isso de maneira muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É preciso pôr fim a isso.” Uma nota publicada, no fim de semana, ressaltou o papel das Forças Armadas no combate ao coronavírus. No entanto, foi considerada insuficiente pelos comandantes das três Forças.
No domingo (12), Gilmar Mendes usou o Twitter para reforçar as críticas.
No aniversário do projeto que leva o nome de Rondon, grande brasileiro notabilizado pela defesa dos povos indígenas, registro meu absoluto respeito e admiração pelas Forças Armadas Brasileiras e a sua fidelidade aos principios democráticos da Carta de 88.
— Gilmar Mendes (@gilmarmendes) July 12, 2020
“No aniversário do projeto que leva o nome de Rondon, grande brasileiro notabilizado pela defesa dos povos indígenas, registro meu absoluto respeito e admiração pelas Forças Armadas Brasileiras e a sua fidelidade aos princípios democráticos da Carta de 88”, escreveu, numa menção ao Marechal Rondon, que defendeu a criação do Parque Nacional do Xingu.
Não me furto, porém, a criticar a opção de ocupar o Ministério da Saúde predominantemente com militares. A política pública de saúde deve ser pensada e planejada por especialistas, dentro dos marcos constitucionais. Que isso seja revisto, para o bem das FAs e da saúde do Brasil.
— Gilmar Mendes (@gilmarmendes) July 12, 2020
“Não me furto, porém, a criticar a opção de ocupar o Ministério da Saúde predominantemente com militares. A política pública de saúde deve ser pensada e planejada por especialistas, dentro dos marcos constitucionais. Que isso seja revisto, para o bem das FAs e da saúde do Brasil”, emendou o ministro do STF.
Nota do ministro
“Ao tempo em que reafirmo o respeito às Forças Armadas brasileiras, conclamo que se faça uma interpretação cautelosa do momento atual. Vivemos um ponto de inflexão na nossa história republicana em que, além do espírito de solidariedade, devemos nos cercar de um juízo crítico sobre o papel atribuído às instituições de Estado no enfrentamento da maior crise sanitária e social do nosso tempo.
Em manifestação recente, destaquei que as Forças Armadas estão, ainda que involuntariamente, sendo chamadas a cumprir missão avessa ao seu importante papel enquanto instituição permanente de Estado.
Nenhum analista atento da situação atual do Brasil teria como deixar de se preocupar com o rumo das nossas políticas públicas de saúde. Estamos vivendo uma crise aguda no número de mortes pela covid-19, que já somam mais de 72 mil. Em um contexto como esse, a substituição de técnicos por militares nos postos-chave do Ministério da Saúde deixa de ser um apelo à excepcionalidade e extrapola a missão institucional das Forças Armadas.
Reforço, mais uma vez, que não atingi a honra do Exército, da Marinha ou da Aeronáutica. Aliás, as duas últimas nem sequer foram por mim mencionadas. Apenas refutei e novamente refuto a decisão de se recrutarem militares para a formulação e execução de uma política de saúde que não tem se mostrado eficaz para evitar a morte de milhares de brasileiros”.